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O que está em jogo no julgamento do RE 635.659 pelo STF?

Hoje, em tese, está marcado o julgamento do RE 635.659, que discutirá a inconstitucionalidade do artigo 28 da lei de drogas.


Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:
I - advertência sobre os efeitos das drogas;
II - prestação de serviços à comunidade;
III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.

O Recurso Extraordinário 635.659 é onde se discute, à luz do art. 5º, X, da Constituição Federal, a compatibilidade, ou não, do art. 28 da Lei 11.343/2006, que tipifica o porte de drogas para consumo pessoal, com os princípios constitucionais da intimidade e da vida privada.


É importante destacar que o julgamento não se limita à maconha, mas aborda o comportamento de todas as pessoas que decidem usar substâncias proibidas, sem fazer distinção entre elas.


Mas o que isso significa? Isso significa que, se for julgado hoje, as drogas estarão "legalizadas"? Em primeiro momento, não.


A lei atual não estabelece um limite de quantidade para determinar quem seria usuário e quem seria traficante. Como resultado, muitos usuários são presos como traficantes, já que não há uma quantidade definida que diferencie as duas condutas.


Estudos do IPEA apontam que estabelecendo critérios quantitativos de 25 gramas de maconha e 10 de cocaína, cerca de 30% dos réus, seriam presumidamente usuários.


O que está sendo discutido?


O que se discute hoje é um caso específico de um usuário que foi pego com 3 gramas de maconha em 2010. Após diferentes instâncias, com a atuação da defesa, o processo chegou até o Supremo Tribunal Federal para que se julgue se é ou não constitucional criminalizar o usuário.


A defesa argumentou que a criminalização da conduta do usuário viola os direitos garantidos pela Constituição, como o direito à intimidade, à vida privada e à dignidade da pessoa humana.


Esse caso ganhou repercussão geral, ou seja, o que for decidido sobre o tema valerá para os demais casos semelhantes.


Agora, sabendo do que se trata o julgamento, é importante ressaltar que o processo não trata da venda de drogas, mas apenas do seu consumo.


A declaração da inconstitucionalidade, por si só, não impediria que medidas administrativas sejam tomadas contra os usuários.


Lamentavelmente, ainda existe a possibilidade de uma reação punitiva por parte das autoridades, seja através de medidas administrativas ou, não podendo mais criminalizar o usuário, classificando-o erroneamente como traficante.


E como está o julgamento?


Até agora, alguns ministros já votaram no julgamento. O relator do recurso, ministro Gilmar Mendes, foi favorável à declaração de inconstitucionalidade do artigo 28, sem fazer distinção em relação à substância utilizada.


O próximo a votar foi o ministro Luís Roberto Barroso, que também foi favorável à declaração de inconstitucionalidade, mas apenas para o consumo de maconha. Ele sugeriu a descriminalização do cultivo de até 6 plantas fêmeas.


O terceiro voto foi do ministro Fachin, que acompanhou o voto do ministro Barroso.


Ainda faltam os votos dos ministros Alexandre de Moraes, André Mendonça, Nunes Marques, Dias Toffoli, Luis Fux, Carmen Lúcia e Rosa Weber, que é a atual presidente do STF.


É necessário que todos os ministros emitam seus votos, e os votos podem ser modificados até o fim do julgamento. Devemos aguardar o pronunciamento da presidente do STF e a publicação oficial do resultado.


É importante mencionar que, atualmente, mesmo que em teoria o usuário não possa mais ser preso, ainda pode ser criminalizado, o que traz consequências jurídicas e materiais.


Caso o artigo 28 seja considerado inconstitucional, a conduta do usuário será considerada atípica, ou seja, deixará de ser crime.


Possíveis preocupações.


Além do artigo 28, há também o seu parágrafo primeiro, que delimita a conduta daquele que, para consumo pessoal, cultiva plantas destinadas à preparação de pequena quantidade de substância entorpecente.


§ 1º Às mesmas medidas submete-se quem, para seu consumo pessoal, semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à preparação de pequena quantidade de substância ou produto capaz de causar dependência física ou psíquica.

Precisamos verificar também como ficará a constitucionalidade do parágrafo primeiro e como será delimitada a conduta daquele que cultiva suas próprias plantas, para consumo pessoal.


O artigo que delimita o tráfico de drogas, que é o artigo 33, também, ao meu ver, precisa de uma análise dentro do próprio julgamento.


O parágrafo terceiro do artigo 33, descreve:


§ 3º Oferecer droga, eventualmente e sem objetivo de lucro, a pessoa de seu relacionamento, para juntos a consumirem:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, e pagamento de 700 (setecentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa, sem prejuízo das penas previstas no art. 28.

Portanto, aquele que, em uma rodinha, "passa" o baseado ou oferece para alguém, mesmo não havendo mercancia envolvida, responderia na figura do artigo 33, §3º. Tal artigo, entretanto, faz alusão direta ao artigo 28 na aplicação da sua pena, devendo também ser modulado.


Conclusão.


O julgamento do RE 635.659 traz consigo a possibilidade de discutir a inconstitucionalidade do artigo 28 da Lei de Drogas, que criminaliza o porte de drogas para consumo pessoal. É importante ressaltar que o processo em questão não abrange a venda de drogas, mas concentra-se exclusivamente no consumo. A declaração de inconstitucionalidade, se ocorrer, não resultará na legalização das drogas, mas sim na não criminalização do usuário.


Até o momento, alguns ministros já proferiram seus votos, como o relator do recurso, ministro Gilmar Mendes, além do ministro Luís Roberto Barroso e ministro Edson Fachin, se posicionando favoravelmente à declaração de inconstitucionalidade. O julgamento ainda aguarda os votos dos demais ministros, e é importante lembrar que os votos podem ser alterados até o fim do processo. Portanto, é necessário aguardar o pronunciamento da presidente do STF e a publicação oficial do resultado.


É válido ressaltar que, mesmo que a conduta do usuário não seja mais considerada crime, ainda podem existir consequências jurídicas e materiais. Além disso, há preocupações em relação ao parágrafo primeiro do artigo 28, que trata do cultivo de plantas para consumo pessoal, e em relação à delimitação do tráfico de drogas no artigo 33, §3º, que também, ao meu ver, precisaria ser modulado dentro do próprio julgamento.


Em suma, o julgamento do RE 635.659, diante da inércia do legislativo, traz a possibilidade de uma mudança significativa na forma como o consumo de drogas é tratado no país, mas é necessário aguardar o desfecho final do processo e considerar eventuais desdobramentos em relação a outros dispositivos da legislação.


Felipe Rocha Dutra

Advogado Criminalista

 
 
 

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